Madame Pochette, curadora do Paço INterno de Cine Inês, abre o jogo com o Guarda-livros, sobre a programação cultural dos vários ambientes e recintos. Ele se surpreende quando, em vez de falar de arte, estética, ela começa trazendo uma memória que vem do esporte, resgatada dos campos de futebol.
Sempre liguei essa palavra, finta, ao futebol. Associada fortemente a um jogador, Garrincha. Era o seu marcante movimento inaugural do drible. Um jogo de corpo que viria, sabia-se. Só não se sabia para que lado. Ou se para a frente, ou para trás.
Um jogo de corpo que desequilibrava os marcadores. Diabrura. Pintava o sete (número de sua camisa, posição de ponta direta) em cima dos adversários.
Por mais esperada que fosse, a finta sempre funcionava. Não havia como prever a direção. Você podia estudar, analisar o cenário, o campo, como se fosse um set, tudo montado em seu devido lugar, ter o controle do jogo. Ledo engano. A finta é que enganava, ludibriava todas as vezes.
Enganava o defensor, por estar no lance, ou também a torcida? Quem estava assistindo, e tinha maior visão do campo?
Pois é. Fintava o marcador na cena, e mais todos os observadores de fora do set. Fintava o set. Eu também fui levado no logro. Assisti o primeiro jogo do Garrincha na Vila Belmiro. Que foi também o primeiro contra o Pelé. 1957. Garrincha já na estrada há um par de anos, Pelé em começo de carreira. Nenhum dos dois marcou gol. Nem precisava. O que valia mesmo era ver e tentar entender a finta.
Por que?
Para atender a um propósito que nada tinha a ver com futebol. Era uma metáfora de um disfarce, de diversionismo. Atrair a atenção para um movimento, de modo que não se perceba a mudança que realmente importa.
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